Entrevista com Isvânia Marques
Por Rafael Rodrigo
Qual seu primeiro contato com a literatura?
– Ainda adolescente. Adorava poesias e contos puramente românticos.
O que a motivou, pela primeira vez, a escrever?
– A timidez. Ficava mais fácil de escrever no papel do que falar às pessoas sobre os meus sentimentos… Lembro que havia um programa, na antiga Rádio Educadora Sampaio local, aos domingos (parece-me), que divulgava os textos dos ouvintes; então, levava os meus num envelope, sob pseudônimo (às vésperas) e colocava embaixo do portão principal da RS.
Qual(is) seu(s) autor(es) de referência?
– Vinicius de Moraes, Cecília Meireles, Arnaldo Jabor, Érico Veríssimo, Augusto Cury, Graciliano Ramos…
Muitos autores enfrentaram diversas dificuldades no início da carreira. Uns superados e outros não. Quais foram suas dificuldades no início de sua carreira como escritora?
– Assim que iniciei a “peregrinação” às editoras, percebi que para um “aspirante” a escritor e sendo este desconhecido no mercado editorial, sua única alternativa é o auto-investimento, numa produção independente e ousada, além de enfrentar os riscos de ser (ou não) sua obra acolhida pela crítica e pelo público leitor. Além dessa mesma ousadia, utilizei o magistério como “ponte” para a divulgação de meus trabalhos. Foi a Escola o primeiro espaço receptivo ao estudo de meus textos.
Como se tornou Presidente da APALCA?
– O primeiro presidente da APALCA foi padre Motinha, em 2001, e Dom Fernando Iório indicou o meu nome para a vice-presidência, durante reunião realizada no Palácio Episcopal, numa manhã de domingo. Embora tenha alegado várias atribuições assumidas em Maceió, fui convencida pelos confrades a aceitar o cargo (para mim soa mais como “missão”) e, já na segunda eleição, estava novamente meu nome liderando a chapa, devido ao exercício temporário como presidente na diretoria anterior. Cumpro, desta feita, a minha terceira gestão à frente do nosso Sodalício.
Na Academia Palmeirense de Letras, Ciência e Artes qual é o papel da Ciência?
– Sendo a Ciência um “conjunto de conhecimentos sistemáticos sobre determinado assunto”, a nossa entidade abre espaço para esse campo, com base nas pesquisas elaboradas por seus sócios, cuja relevância é a sua contribuição para a comunidade da qual estão inseridos.
A impressão que se dá é que a Academia é elitizada e inacessível ao povo. Qual sua opinião sobre isso?
– Realmente é uma “impressão” apenas, pois TODAS as Academias ligadas à cultura e à literatura (e à Ciência, de forma específica) visam INTERAGIR com a comunidade. Existe em torno delas o estereótipo do “inatingível”, mesmo sendo suas ações ampliadas a um público eclético e à diversificação de suas funções. A nossa APALCA, por exemplo, realiza seu papel por meio de eventos literários e culturais (saraus, palestras com temas diversos, concursos literários, biblioteca acessível, lançamento de livros, além do folclore e do teatro levados às ruas próximas à sede acadêmica). Confesso que há muitas pessoas que ainda desconhecem a nossa entidade, embora utilizemos os mecanismos de comunicação para divulgação desses eventos. Mesmo assim, já avançamos (e muito!). E, assim como “a praça é do povo”, a Academia não pode ser diferente, não é mesmo?
Sobre sua obra, qual dos livros pode-se dizer que é autobiográfico?
– A impessoalidade não é o meu forte. Há uma “interferência” não-intencional, espontânea em tudo o que faço e escrevo. Até nos contos infantis, nos poemas, no reconto da lenda de Tilixi e Tixiliá , consigo inverter os papéis com os personagens e/ou situações do texto. Em suma: há um pouco (às vezes, muito) de mim em cada página de meus escritos (sejam eles em prosa ou poesia).
Em Para ti, Graci(liano)… o leitor tem a impressão de ser uma carta de amor ao Mestre Graça. É isso mesmo?
– É um misto de sensações sentidas que somente a literatura me permite experimentar… Se o “poeta é um fingidor”, o escritor também pega carona nos personagens e vivencia situações que jamais imaginou. E o melhor: não se pune por isso, pois o livro é um espaço onde a ousadia é pura libertação. E é nesse espaço que exercito a minha imaginação…
Nessa homenagem a Graciliano Ramos, houve alguma descoberta interessante?
– Comecei há pouco tempo a estudar Graciliano Ramos (um olhar ainda míope, confesso!) e tenho encontrado revelações importantes, especialmente quando me deparo com o educador nato despertado desde quando exerceu o “magistério matuto” aqui, em Palmeira dos Índios, ainda jovem. Mais tarde, Inspetor da Instrução Pública do Estado de Alagoas (cargo de Secretário de Estado da Educação, atualmente), preocupou-se com a merenda e o fardamento escolar, priorizando as crianças em fase de letramento. Com tais atitudes, cai em descrédito o rótulo que lhe foi dado de “homem insensível, frio”.
Quem é Graciliano Ramos, para você?
– Um menino simples, cuja infância foi marcada pela aspereza de uma educação que o tornou (até aproximadamente 09 anos) avesso à alfabetização; um jovem corajoso, que arriscou o jornalismo no Rio de Janeiro, voltou para Palmeira e foi caixeiro na Loja Sincera de seu pai; um homem – autodidata – que superou todas as suas dificuldades por meio das leituras aos livros, escreveu seu primeiro romance, Caetés, em Palmeira (1925-28), tornou-se prefeito movido pelas circunstâncias da época (não por querê-lo), deixando-nos o legado da ética e da transparência no seu exercício como político; um escritor sensível às mazelas de seu tempo, utilizando suas obras para denunciar a miséria, a corrupção, a ânsia do poder e a exploração da pobreza; um ser imperfeito (como nós todos), mas essencialmente humano (conforme se revelou nas páginas de seus livros) e admiravelmente romântico (ao escrever cartas de amor para Heloísa). Apaixonei-me por todos eles, a cada leitura iniciada (ou repetida).
* Dessa forma, acabo de responder – também – à pergunta anterior (que tentei fugir!)…
Para os leitores, muitas vezes desmotivados a escrever e a ler, quais suas palavras para reverter isso?
– A minha experiência como professora me deixa desnorteada diante da indiferença da maioria dos jovens à leitura, nos dias atuais. Eles confundem a comunicação eletrônica como a melhor forma de informação, descartando a leitura, a pesquisa e a produção textual como exercícios fundamentais para a elaboração/criação de um novo texto. Entusiasmam-me aqueles que, de forma espontânea, buscam os livros em seus diferentes temas como subsídio para seus estudos e preparação para vestibulares e outros concursos. O diferencial de um jovem que lê e de outro que rejeita esse instrumento (do saber) é que para o primeiro há um futuro repleto de possibilidades de sucesso, enquanto para o outro, a sorte (sinônimo de insegurança) prevalecerá em seus dias.
Isvânia Marques (professora e escritora)
Maceió, 03/11/2013.